chatos são os outros? (a responsabilidade de cada um)

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nada de culpa cristã aqui. mas você acha sempre que chatos são os outros, né? você é responsável pelo que acontece contigo. se você foi agredido por causa de algum preconceito vindo do agressor, é claro que a culpa não é sua, mas do imbecil que te agrediu. o que quero dizer é que nós temos uma parcela de culpa em qualquer coisa, por mais dolorido que isso seja. chatos são os outros? (a responsabilidade de cada um) é assumir que não. entender isso, enfrentar isso, é o primeiro passo para resolver o problema de se conhecer e conhecer o outro melhor. às vezes nossa responsabilidade é indireta, como não eleger imbecis, porque estes dão força aos imbecis maiores e menores. se você elege quem se importa com o outro e se cerca de gente assim, a probabilidade de ser agredido é menor e, caso aconteça, você sabe o que vai ocorrer com o agressor: punição justa, dentro do processo democrático. um mendigo na rua não é culpa sua, você paga seus impostos, mas você pode ser parte do problema, ou da solução. aí é escolha é sua. escolher ser parte da solução é isso: um tipo de chato, o consciente.
O pintor mexicano Octavio Ocampo nasceu em 1943 e sua arte é cheia de ilusões, como neste quadro Mouth of Flower. Muitas vezes a visão que temos de nós mesmos é assim, baseada em ilusões. Se não conseguimos enxergar como realmente somos, por que achar que sabemos quem é o outro? Esse é o chato pretensioso, dono da verdade. um ser perigoso para a sociedade.

chatos são os outros? eu sou chato e você também é. vamos combinar assim. cada um assume o seu erro. é simples, prático, eficiente, incolor e indolor.
quer dizer, quase indolor.
dói na alma de quem admite o erro, nesse orgulho besta, da gente que precisa assumir em público o “ops, fui eu”, my mistake, i’am sorry, i beg your pardon,  excusezmoi, Je suis désolé, eu fiz merda.

é isso.

desde bebês somos assim. a gente brinca com a colher enquanto finge que come a comida da mãe. derruba a colher na frente da mãe. ela olha com olhar de bronca e diz nosso nome em tom de reprovação. a reação é imediata. e por isso mesmo, irracional: não fui eu, mãe!

como não foi?
cinco segundos depois, percebemos a burrice que falamos. assumimos, constrangidos, o erro. mas procuramos desculpas, falhas nos outros, no tempo, na colher que é torta e me enganou, a comida que é sem gosto, ou: não tô cum fome…

a gente cresce e a síndrome do “não fui eu” continua.

Crescemos. Crescemos?

a gente pega o ônibus. se aproxima da porta pra descer. dá o sinal. soa o barulhinho do sinal. acende a luz de que a parada foi solicitada. o ônibus ameaça passar reto, mas não passa porque o sinal vermelho ligou. aí o passageiro olha para o cobrador, o cobrador diz para o motorista: vai descer. aí o motorista abre a porta, não sem antes falar, porque ele podia ficar calado mas não fica, e diz: tem que tocar o sinal…

o que falar nessa hora?

a gente aponta para a luz piscando, indicando que o sinal foi dado. o motorista insiste em falar as groselhas dele. aí você se irrita e fala: eu toquei, a luz acendeu, apitou, mas você não viu nem ouviu. e o motorista continua falando. você desce, irritado e não dá mais bola. o motorista segue a vida dele achando que está certo. e você vai embora, achando que o mundo é injusto e as pessoas são insuportáveis.

o cidadão zen-budista diria: relaxe, não se deixe abater por isso. a vida é bela, não se estresse, um motorista de ônibus não vale a úlcera.

eu mandaria esse cidadão zen-budista à merda. depois eu diria: qualquer um vale a úlcera. se eu quisesse ter uma. mas não quero. justo eu que sempre procuro tirar algum ensinamento zen-budista das coisas chatas da vida. e tirei essa: as pessoas têm uma dificuldade monstruosa de assumir as merdas. bastava dizer: o senhor deu o sinal? então me desculpe, eu não ouvi. me desculpe mesmo…

Pedir desculpas e admitir que errou: que horror!

o que eu faria? nada. diria, ok, sem problemas.

o que diria minha vizinha, que fica num determinado andar do meu prédio? (o apelido que eu dou pra ela é dona clotilde)
bom, ela xingaria o motorista (mesmo ele se desculpando), daria um sermão para ele prestar mais atenção, que ele é um mau motorista (conclusão e julgamento a partir de poucos minutos de observação, ela é um gênio)…

a “dona clotilde” é insuportável naturalmente. levou décadas para construir seu currículo de chata. não é algo fácil.
já os motoristas de ônibus, que ganham mixaria, trabalham muito, aguentam donas clotildes e afins, estão no limite do estresse. e por isso também são chatos e insuportáveis.
quando eu estou assim, sou chato e insuportável também. porque todas as pessoas no limite são chatas e insuportáveis.

menos os zen-budistas.

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